Post 09: Memória

Acha que seria importante para sua aprovação se você pudesse se lembrar de tudo, ou quase tudo, que você já leu ou estudou?

Eu não tenho dúvidas de que seria! E espero que você também tenha respondido positivamente.

É interessante notar que essa simples pergunta já é capaz de mostrar como, muitas vezes, por seguirmos nossa intuição ou o que as pessoas normalmente recomendam, não nos dedicamos ao que realmente é importante.

Releia a pergunta.

Questionei sobre a importância de qual ação?

Lembrar.

Lembrar é crucial no momento de responder uma questão. 

Se você não se lembrar, de nada terá adiantado ter lido, ouvido, compreendido e aprendido qualquer conteúdo.

Quem, como eu, já estuda há algum tempo, tem consciência que já teve contato com grande parte do conteúdo de um edital. Foram cinco anos de faculdade e alguns outros estudando, mesmo que de forma inconstante ou não direcionada para concursos.

De nada adianta aprender conceitos importantes, estudar jurisprudência e leis diversas se não for capaz de se lembrar no momento da prova.

Podemos concluir que a memória é essencial para o aprendizado e que lembrar é essencial para a aprovação.

Acho que a maioria concorda com isso. 

Bem, se é tão importante lembrar, por que não dedicamos grande parte de nosso tempo a isso? Por que a rememoração (a prática do lembrar) não recebe a devida atenção na preparação da maioria de nós?

Eu tenho um palpite: não nos dedicamos tanto à rememoração porque não sabemos muito bem como a memória funciona.

Acredito nisso porque, tirando o caso de pessoas que estão apenas enganando a si mesmas e aos que estão próximos, a maioria de nós realiza um esforço sincero e dedica horas preciosas todo dia para conquistar a aprovação e não adotaria estratégicas ineficientes deliberadamente.

Ok. Mas e aí, como a memória funciona?

Esse é um tema complexo e vou fazer apenas uma simples introdução, com o fim de identificar estratégias para gravar, manter e recuperar uma memória de forma mais eficiente. Essa introdução é baseada, em grande medida, nas obras de Scott H. Young (que tem um site excelente) e de Stanislas Dehaene (links no Post 08).

Inicialmente, é preciso deixar claro que não existe apenas um tipo de memória, mas vários, que funcionam de forma diferente.

A classificação mais aceita divide a memória em memória prospectiva (coisas que temos que fazer, como compromissos futuros) e memória retrospectiva (coisas que aconteceram no passado), que é a que nos interessa.

A memória retrospectiva, quanto ao conteúdo, é dividida em duas espécies:

Memória implícita ou procedimental: memória de como realizar uma atividade (escovar os dentes, andar de bicicleta, tocar um instrumento)

Memória declarativa: memória de fatos e conceitos (memória semântica) ou memória de acontecimentos (memória episódica).

Mas a memória retrospectiva também pode ser classificada quanto à duração:

Memória de trabalho: memória breve e limitada que nos permite trabalhar com raciocínios ou lembrar de algo por breve período (um número de telefone até anotá-lo)

Memória de longo prazo: são as informações armazenadas no cérebro de forma mais permanente.

Feita essa breve apresentação, e possível identificar qual a memória mais importante para nós: a memória semântica de longo prazo.

Precisamos nos lembrar de fatos e conceitos durante um período considerável de tempo.

Mas isso não significa que as outras memórias não sejam importantes. Pelo contrário, existem estratégias que envolvem a memória de trabalho e a memória implícita e vou trazer algumas dicas sobre isso futuramente. Mas precisamos dar ênfase ao mais importante, ao que pode trazer mais resultados para nós.

Além dos tipos de memória, é importante conhecer também como uma memória é formada e mantida no cérebro. São basicamente três etapas:

  1. Codificação: inserir informações na memória
  2. Armazenamento: manter informações na memória
  3. Recuperação: acessar e recuperar informações da memória

Quando você estuda um conteúdo, você o está codificando. E existem formas mais eficiente que outras de se fazer isso.

Apenas uma parte muito pequena do que você acabou de estudar é transferida para a memória de longo prazo. É somente com o sono que essa transferência ocorre de forma relevante. É o momento da consolidação, em que o cérebro transfere as informações obtidas durante o dia para a memória de longo prazo.

Mas acredita-se que nem toda a informação é transferida, pois o cérebro é seletivo. Além disso, existe ainda uma dificuldade crescente no tempo de recuperar essas informações. Ou seja, regra geral, quanto mais o tempo passa, fica mais difícil se lembrar daquilo que foi armazenado na memória de longo prazo.

E a forma mais eficiente de manter essa informação na memória de longo prazo é praticando a rememoração, lembrando dela ativamente e com certa frequência.

Essa é uma explicação muito básica, mas que vai permitir identificar várias estratégias para reforçar cada uma das etapas acima. A ideia é codificar melhor, armazenar melhor e recuperar melhor.

É possível que, com essa introdução, você já perceba alguns pontos a melhorar em sua preparação. 

Pelo que já vivenciei, um dos pontos mais negligenciados é a recuperação, a rememoração. Muitas vezes nos preocupamos somente em abarrotar o cérebro de informações e quase não praticamos a rememoração.

Infelizmente, isso não é eficiente, pois é muito mais difícil lembrar quando você não pratica rememoração.

O próprio ato de rememorar, notadamente quando existe esforço envolvido, fortalece as conexões neurais e torna cada vez mais fácil rememorar futuramente um conteúdo.

Para não esquecer, é fundamental lembrar. E, se é difícil lembrar, será difícil esquecer.

Mas como isso funciona na prática? 

Bem, se você se limita a reler seu material, não estará praticando rememoração. Estará apenas revendo, fazendo o reconhecimento do material como já visto anteriormente, o que ajuda pouco na codificação e no armazenamento e ainda menos na rememoração.

Mas o que fazer para aprimorar uma revisão? Transforme-a em uma atividade de rememoração ativa.

Uma forma de fazer isso é tentar lembrar os conteúdos antes de ler o material. Só depois de se esforçar e lembrar o máximo que conseguir, você obtém seu feedback, conferindo o que errou, o que ficou faltando e aí sim fazendo uma revisão proveitosa.

Uma outra forma de fazer isso, considerada a mais eficiente para o aprendizado, é através de testes práticos, questões no formato em que seu concurso cobra (objetivas e/ou subjetivas). Não necessariamente devem ser questões de concursos passados, pois você pode elaborar as suas próprias questões.

É importante deixar claro que, para que uma estratégia se torne mais eficiente, as peculiaridades de cada concurso e de cada conteúdo devem ser consideradas.

Sei que já falei sobre a importância das questões em posts anteriores, mas esse tema vai ser companhia constante por aqui em razão de sua relevância.

Existem várias estratégias e técnicas para aprimorar o aprendizado e pretendo trazer informações sobre muitas delas. E não somente apresentá-las, mas tentar aplicá-las ao máximo à realidade dos concursos.

Eis alguns assuntos que pretendo abordar: prática de rememoração, repetição espaçada, prática deliberada, intercalação, foco, engajamento ativo, feedback, sono e consolidação, elaboração, transferência eficiente, geração, reflexão, estado e contexto, dificuldade desejável, processamento aprofundado e ativação difusa, entre outros.

Vou começar a tratar deles no próximo post.

Obrigado por chegar até aqui.

Vamos juntos!

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