Post 16: Feedback de erro

Continuando a série de postagens sobre os pilares do aprendizado (atenção, engajamento ativo, feedback de erro e consolidação), na lição de Stanislas Dehaene. Post baseado no livro How We Learn: Why Brains Learn Better Than Any Machine … for Now (https://amzn.to/31PRxoV).

O tema de hoje é feedback de erro.

Achei muito interessante o autor optar pela expressão feedback de erro quando poderia utilizar somente feedback. Com a leitura da obra, fica claro que foi uma escolha acertada, porque o erro é essencial para o aprendizado. Segundo Dehaene:

“Cometer erros é a forma mais natural de aprender. Os dois termos são virtualmente sinônimos, porque cada erro oferece uma oportunidade para aprender”.

Ele continua:

“Seria praticamente impossível progredir se não começássemos falhando. Erros sempre diminuem na medida em que recebamos feedback que nos mostre como melhorar. E é por isso que o feedback de erro é o terceiro pilar do aprendizado e um dos parâmetros educacionais mais influentes: a qualidade e a precisão do feedback que recebemos determina quão rápido aprendemos.”

Quando formulamos uma hipótese (ou respondemos uma questão), expectativas são inevitavelmente geradas, o que inclui uma previsão de acerto. Então confrontamos nossa resposta com realidade (o gabarito) e vem, de alguma forma, a surpresa, uma mensagem de erro. E essa mensagem de erro, a intensidade desse sinal de surpresa, é usada pelo cérebro para mudar nossa representação interna, no sentido de que nossa próxima resposta seja mais próxima da correta. Dehaene apresenta uma definição fantástica sobre aprendizado:

“Aprender é restringir o imprevisível”.

E o mais interessante é que o erro que gera essa mensagem não decorre necessariamente do erro da questão.

Esse erro essencial para o aprendizado é um sinal interno em nosso cérebro que também acontece quando acertamos, pois ele decorre da diferença entre a expectativa e o resultado.

Imagine uma questão CESPE de certo ou errado. Quando você não sabe a resposta correta e chuta, seu cérebro prevê que tem 50% de chance de acertar. Aí você confere e vê que acertou. A realidade mostrou que estava 100% certo. Essa diferença (entre 50% da previsão e 100% da realidade) gera um sinal de erro e dele você deve extrair o melhor feedback possível, identificando o conteúdo necessário para melhorar sua previsão e seu resultado. O mesmo vale para qualquer tipo de questão.

Sempre há uma expectativa e uma realidade. E a diferença pode ocorrer tanto quando você erra como quando você acerta. Sempre é uma oportunidade para aprender. Utilize esse mecanismo cerebral a seu favor. Aprenda também com seus acertos.

Como todos nós sabemos, é possível acertar questões sem saber muito bem o conteúdo, seja eliminando algumas opções, utilizando raciocínios que não correspondem à realidade e levam, de alguma forma, à resposta correta, ou simplesmente chutando. A surpresa do acerto também deve ser utilizada para aprender e evoluir.

Por isso eu costumo dizer que as questões são a bússola que orientam a preparação. O feedback que podemos extrair delas possibilita a correção de nossa trajetória. Sobre isso falei um pouco nos Posts 06 e 07, lembrando que nossa caminhada não vai ser em linha reta.

Dehaene fala muito sobre a educação tradicional, sobre o aprendizado de crianças e adolescentes. E mostra como algumas abordagens são prejudiciais, a exemplo de práticas que inibem a curiosidade ou que usam os testes como forma de punição e não como uma das principais formas de aprender. 

Nossa jornada se torna muito mais interessante quando temos a humildade de repensar aquilo que adotamos como verdade absoluta simplesmente porque vem sendo repetido através das gerações. Não vou abordar esses temas aqui, pois não é meu objetivo. Mas seria muito bom ver com mais frequência profissionais da educação utilizando as descobertas robustamente demonstradas pela neurociência para auxiliar ainda mais o aprendizado, principalmente de crianças e adolescentes. Não se trata de mudar tudo, mas de fazer pequenos aprimoramentos que podem trazer resultados significantes.

As abordagens mencionadas, que inibem a curiosidade ou usam testes como punição, são prejudiciais porque geram stress e ansiedade. E numerosos estudos demonstram que esses dois fatores podem prejudicar muito a habilidade de aprender, reduzindo a plasticidade neuronal. E o oposto, que é estar em um ambiente livre de medos, que estimule a curiosidade e o crescimento, auxilia, e muito, o aprendizado. Funciona como “uma fonte da juventude” para nosso cérebro.

Por isso é importante cultivar um ambiente de preparação o mais livre possível de medos, stress e ansiedade. Cuide da saúde física e mental. Crie seu cantinho sagrado de aprendizado e evolução. Supere o medo de aprender. Não é fácil, mas é possível.

É óbvio que ficar totalmente livre é impossível. Bom senso é importante na preparação e na vida. E, se as coisas ficarem muito difíceis no caminho, você deve procurar ajuda psicológica e/ou médica. Não há nada de mal nisso. Pelo contrário, é o mais certo a se fazer.

Retomando. Dehaene afirma:

“Testar regularmente o conhecimento de estudantes, um método referido como ‘prática de rememoração’, é uma das estratégias educacionais mais efetivas. Testes regulares maximizam o aprendizado de longo prazo. O mero ato de testar sua memória faz dela mais forte. É um reflexo direto dos princípios do engajamento ativo e feedback de erro. Fazer testes força você a encarar a realidade, a fortalecer o que você sabe e a identificar o que você não sabe.”

Quando você faz questões, você recebe feedback real, criando uma autoconsciência, ou meta-memória, que é extremamente útil para mostrar os pontos em que você precisa focar e o que ainda falta aprender.

O autor faz considerações sobre a rememoração ativa e a repetição espaçada, temas que já abordei nos Posts 10 e 11. Se quiser saber mais, dê uma conferida.

Vou finalizar com uma colocação de Dahene sobre provas finais, também aplicável a concursos, que muitos de nós já comprovamos na prática e que nos ajuda a lembrar que toda estratégia comprovadamente eficiente pode ser utilizada para aprimorar nossa preparação, sem significar que a forma como estudamos seja errada ou certa:

“Revisão de última hora não é necessariamente ineficiente: caso o estudante tenha feito esforços para aprender nos meses anteriores, o estudo intenso antes de uma prova refresca o conhecimento na memória e vai ajudar a mantê-lo vivo por um período. Todavia, uma revisão regular do conhecimento, ano após ano, provavelmente irá trazer benefícios ainda maiores.”

Cabe a cada um, conhecendo um pouco mais sobre o funcionamento do nosso cérebro e sobre as diferentes estratégias de estudo, decidir se há alguma técnica que possa utilizada para aprimorar a sua preparação.

Ou, pelo menos, aprender alguma coisa sobre o funcionamento de nossa mente. E, se isso acontecer, já vai ser motivo de alegria para mim. E espero que para vocês também.

Vamos juntos!

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